Casa de Fataunços, Turismo de Habitação

CASA DE FATAÚNÇOS

Uma viagem ao passado da região de Lafões.

Fataunços não faz parte de nenhuma rede de aldeias notáveis, mas quem passar por esta pequena localidade não consegue ficar indiferente aos majestosos solares que se erguem naquelas margens da estrada nacional 228. Pedro Manuel da Franca Teles de Meneses (Pedro Teles de Meneses) é proprietário de um deles, a Casa de Fataunços. Engenheiro civil de profissão, tem cuidado a entrar num campo que não é o seu, mas arrisca a contar a sua versão do porquê de tantos solares por metro quadrado em tão pequena povoação. “Penso que, no século XVIII, Vouzela tinha um cariz histórico maior que os concelhos limítrofes, como Oliveira de Frades e São Pedro do Sul, localidades burguesas que ganharam maior notoriedade durante o século XIX -, o que levou a nobreza rural a instalar-se ali, dando origem a uma série de casas e solares”, explica. Entre outras, residiam ali três grandes famílias, os “Alcoforados”, os “Amorim Girão” e os “Menezes e Castro”, um dos braços da sua família.

Datada do século XVIII, a hoje Casa de Fataunços era originalmente pertença de médico local até ser adquirida em 1896 por Aires Menezes e Castro - bisavô de Pedro Teles de Meneses -, personalidade imortalizada num retrato a óleo patente na biblioteca da casa. Por ironia do destino, Aires Menezes e Castro viria a falecer pouco tempo depois, deixando a propriedade à esposa, que sem fontes de rendimento e quatro crianças para criar, viu-se obrigada a vender grande parte do espólio do solar. Apesar do esforço, a Casa de Fataunços acabaria em hasta pública e adquirida pelo avô de Pedro Teles de Meneses que, já radicado em Lisboa e com outras propriedades na região de Lafões, nunca faria dela sua residência. A esposa de Aires Menezes de Castro ali permaneceu até falecer, em 1966.

Início difícil
Com a família radicada em Lisboa e proprietária de outras habitações na região de Vouzela, que utilizavam para passar férias, a Casa de Fataunços não teve residentes nos 30 anos seguintes. Pedro Teles de Meneses conta que a família ia fazendo as reparações necessárias à sua manutenção, mas ninguém a utilizava, o que o levou a fazer um desafio aos familiares. “Em 1996, eu e a minha esposa reunimos a família e defendemos que aquela casa só tinha dois futuros possíveis: ou era vendida ou aproveitada para o turismo, de forma a auto-sustentar-se”, conta. O desafio foi aceite. Pedro Teles de Meneses tornou-se o proprietário único da casa brasonada pela bisavó e avançou com um projeto de investimento para a converter num turismo de habitação. Em 1998, a Casa de Fataunços abre ao público.

Casa de Fataunços, sala de estarMais habituado ao desenho e construção de estradas e auto estradas, o engenheiro não se mostrou um brilhante empresário do turismo nos primeiros anos do empreendimento. Com a parceria da esposa, tentaram recriar o ambiente original da casa. Foram adquirindo peças de mobiliário e de decoração dos séculos XVIII e XIX e abriram o solar ao público. A ideia era fazer da Casa de Fataunços uma pequena Casa de Mateus - “sem me pôr em bicos dos pés”, sublinha, - e proporcionar visitas guiadas com piqueniques e outras atividades nos jardins. Mas, não funcionou. “Os primeiros anos foram de prejuízo crónico”, confessa. “Eu desconhecia completamente a importância do marketing”.

Porém, o compromisso que tinha assumido com os apoios públicos, aquando do projeto de recuperação e de reconversão da casa para aproveitamento turístico, somado ao cariz pessoal do investimento e à perseverança típica dos engenheiros no encontro de soluções, persistiu. Colocou o alojamento na plataforma de reservas booking.com e desenvolveu várias ações de promoção locais e regionais. E, por volta de 2005, a Casa de Fataunços começou a ganhar dinâmica. Hoje, é com orgulho que afirma a sustentabilidade da Casa de Fataunços nos últimos 15 anos. “Até gera alguma receita adicional, ainda que seja muito pequena”, adianta o engenheiro, entretanto aposentado.

Lafões: uma região em emancipação
Com referências como a região do Douro, a norte, à Serra da Estrela, a oeste e a costa, a este, a região de Lafões tem ainda alguma dificuldade em destacar-se como destino turístico de referência no centro do país. Esta é, pelo menos, a perceção de Pedro Teles de Meneses, de acordo com o perfil do turista que chega à Casa de Fataunços. No que concerne ao visitante nacional, “o município tem feito um excelente trabalho ao nível da promoção e valorização dos patrimónios locais, mas a nossa região acaba ainda por ser um local de passagem para quem se desloca para o Douro ou para cidades como Viseu e Aveiro”, diz.

Na Casa de Fataunços, os turistas nacionais representam 80% das dormidas. Os estrangeiros vêm sobretudo de Espanha e de outros países europeus e, mais esporadicamente, dos EUA e de outras geografias. Nos últimos anos, os franceses têm vindo a ganhar expressão, o que o levou a convidar a editora do guia francês Petit Futé para Portugal a passar uns dias na Casa de Fataunços com o intuito de promover o solar e a região. “Não me fiquei por Vouzela. Levei-a a São Pedro do Sul, às Serras da Arada e Gralheira, São Macário, à Pena, entre outros locais”, conta. A senhora ficou agradavelmente surpreendida e o resultado foi um maior destaque da região na edição atual do guia e um aumento do número de hóspedes de nacionalidade francesa na Casa de Fataunços.

casa de Fataunços, guia museuIniciativas como a Ecopista de Vouzela, a criação do Parque Natural Local Vouga-Caramulo, a valorização dos caminhos pedestres e de outras áreas de lazer do concelho são passos que, na opinião do empresário, vão na direção certa. “Ainda é cedo mas, a seu tempo, darão os seus frutos”, diz Pedro Teles de Meneses. O empresário saúda também o recente aproveitamento e valorização do património arqueológico. “Se for bem aproveitado, o património arqueológico do neolítico que temos aqui é um fator diferenciador e de valorização da região”, defende. “Nós não somos o Gerês em termos naturais, nem temos património arquitetónico de relevância significativa, mas temos um vasto património natural e um enquadramento paisagístico que se acompanhado por um bom ordenamento do território, confere à região um enorme potencial”, conclui.

Todavia, o empresário não se coíbe de apontar também algumas lacunas da região. “Acho que do ponto de vista gastronómico estamos com alguns problemas que as pessoas ainda não se aperceberam”. A região é conhecida pela tenra e suculenta Vitela de Lafões e pelo doce Pastel de Vouzela mas, para o empresário, “sabe a pouco”. “Houve uma grande evolução dos hábitos alimentares dos europeus nos últimos anos e a nossa região ficou parada”, diz. Pedro Teles de Meneses recorda um episódio de um casal de britânicos que ficou alojado na Casa de Fataunços durante uma semana. “No primeiro dia provaram a vitela e gostaram. No segundo provaram o cabrito e gostaram, mas ao terceiro já estavam enjoados de carne e não tinham alternativa”, conta. “Um vegetariano que chegue aqui à nossa região está desgraçado [risos]”, diz. “Apesar da riqueza que temos, falta [à região] dar um salto qualitativo neste campo”, defende.

Música em Fataunços
Depois do projeto menos bem conseguido de abrir as portas da Casas de Fataunços ao público, Pedro Teles de Meneses tem vindo a apostar numa das suas grandes paixões, a música. Munida de três pianos e salas capazes de albergar algumas dezenas de pessoas, o empresário tem vindo a promover concertos de música clássica e de câmara no solar, mas o marketing não é claramente o seu forte.

Em tempos, chegou a contactar o Município para juntos lançarem as sementes de um “Festival de Música de Lafões”. “Obviamente, não seria reduzido à minha casa, temos o Cineteatro de Vouzela, São Pedro do Sul, Igrejas e outros locais, e eu tenho conhecimentos com muita competência na área”, explica. A ideia foi bem recebida e apadrinhada, mas acabou por não se concretizar. Mais uma vez, Pedro Teles de Meneses persistiu e tem organizado concertos na Casa de Fataunços, alguns com profissionais de renome mundial. Edgar Schäfer, tenor alemão com um vasto currículo internacional, que voltará à aldeia de Fataunços no próximo dia 14 de maio, é um deles. “É pena eu não conseguir promover melhor estes eventos”, desabafa.

Seja em relação à música ou ao turismo, Pedro Teles de Meneses mantém o otimismo e acredita que o setor vai continuar a dinamizar a economia do país e a região de Lafões. “Acredito que o turismo retome a tendência interrompida em 2019, mas a procura nacional deverá afrouxar um pouco, porque os portugueses vão regressar ao turismo internacional”, diz. Já sobre a procura internacional, o empresário vê o futuro com bons olhos. “Portugal é um país que está ainda em descoberta pela Europa e pelo mundo, é um país seguro e vai continuar a crescer. É com bastante otimismo que encaro o futuro de Portugal no turismo”, remata.

@iNature.

Casa de Fataunços, Turismo de Habitação, sala de estar

Casa de Fataunços, Sala de estar

Jardins da Casa de Fataunços

Jardins da Casa de Fataunços